quinta-feira, 12 de julho de 2012

Plano de Aula de Lingua Portuguesa - Fantástico e Imperdível!

As fases da poesia de Drummond  Plano de aula relacionado à edição 178 de BRAVO!  Vinte e cinco poemas inéditos de Drummond foram descobertos recentemente. Aproveite o fato para apresentar as diferentes fases deste poeta aos alunos.
 
 






Objetivos
-Analisar nos poemas inéditos a gênese da formação poética de Carlos Drummond de Andrade em comparação com sua obra madura.
- Contextualizar a obra de Drummond como um dos marcos da geração de 1930.
-Destacar os elementos característicos da poesia de Carlos Drummond de Andrade em especial: a ironia, o humor, a poesia de matiz social e a análise metafísica do mundo.
- Observar a influência da obra poética de Drummond na poesia e na música do século 20.- - Comparar os poemas de Drummond com a sua obra de formação e com canções e poemas de outros autores.

Anos
Ensino Médio

Conteúdos
- Geração de 1930
- Poesias de Carlos Drummond de Andrade
- Comparação literária

Tempo estimado
Quatro aulas

Materiais necessários
- Cópias da reportagem "A pré-história de Drummond" (Bravo!, edição 178, junho de 2012)
- Cópias dos poemas "Poema das sete faces"; "O amor bate na aorta"; "José" e "A morte do leiteiro", de Carlos Drummond de Andrade e do poema "Com licença poética", de Adélia Prado para todos os alunos.
- Cópias das letras das canções "Let’s play that", de Jards Macalé e Torquato Neto, e "Até o fim", de Chico Buarque.
- Computador com projetor de vídeo para a exibição do curta-metragem "O Fazendeiro do ar", dirigido por Fernando Sabino e David Neves.
Introdução
Carlos Drummond de Andrade, mineiro de Itabira radicado no Rio de Janeiro, é um autor de dimensão universal. Sua obra é das mais significativas, não apenas para a literatura brasileira, mas para toda a literatura de Língua Portuguesa.
As características de sua poesia podem ser analisadas como um processo. Inicialmente, é notável a influência da geração heroica do Modernismo, especialmente Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Manual Bandeira. Em 1930, Drummond publica o livro Alguma poesia. Neste volume, ficam claras a ironia, a coloquialidade, o prosaico e uma leitura não convencional do cotidiano. A visão de mundo do poeta aparece como um modo de propor uma reflexão subjetiva sobre temas amplos como ser brasileiro, o amor, a literatura, a política, a religião e impressões poéticas de viagens e cidades. Muitos poemas desta obra surgem de acontecimentos do cotidiano, aparentemente banais, mas que servem como reflexões poéticas e líricas sobre a vida. É também clara a filiação ao Modernismo, evidente com o uso do verso livre, uma sequência natural das rupturas estéticas e temáticas proporcionadas pelo movimento de 1922.

Nos livros seguintes, Brejo das Almas, Sentimento do Mundo, José e A rosa do povo, o poeta busca um aprofundamento desta subjetividade. A ironia e o humor vão se diluindo em uma visão de relativa amargura que culmina em um clima de denúncia social, próprio do intervalo entre 1930 e 1945. No Brasil, estava em curso a Era Vargas e a ditadura do Estado Novo. Na Europa, acontecia a ascensão de Hitler e do nazi-fascismo, a revolução comunista e a escalada de violência e dos conflitos políticos que culminaram na Segunda Guerra Mundial.

Este espírito da época reflete-se na poesia de Drummond. Nota-se a presença da angústia sobre o destino da humanidade, a incerteza sobre a efemeridade da vida, a dúvida sobre o caráter benevolente do ser humano e uma relativa obscuridade. Por meio de um tom social, o poeta expõe os absurdos do "mundo, vasto mundo", onde as rimas não são propriamente soluções, mas expressões, ora irônicas, ora angustiadas, do espírito de seu tempo.

A poesia de Drummond assume, após este período, um viés metafísico e existencialista. O questionamento passa a ser a própria condição humana e o poeta resgata as marcas irônicas e as preocupações formais que marcaram sua obra. Ao final de sua vida, na passagem dos anos 1970-1980, produziu uma obra mais sentimental, menos preocupada com as inovações formais ou as angústias metafísicas do início.

Na reportagem "A pré-história de Drummond", BRAVO! destaca o aparecimento do livro 25 poemas da triste alegria, escrito em um único exemplar durante a juventude do poeta e desconhecido por boa parte da crítica. As poesias, que ficaram inéditas por quase 90 anos, foram descobertas e serão publicadas neste mês. A reportagem publica seis dos 25 poemas, que são um bom ponto de partida para analisar as características da poesia de Drummond.

Leia mais Drummond: um caminho sem pedras
Desenvolvimento
Aula 1
Antes de iniciar, leia a reportagem de Bravo! e destaque nas poesias inéditas de Drummond elementos que possam indicar a gênese de sua poesia. Observe a influência da estética penumbrista e  menções a palavras e temas que são estranhos à obra madura do poeta. Destaque a preocupação com a musicalidade e o ritmo das palavras e do interesse por questões de seu tempo, aspectos que seriam aprofundados posteriormente. Compare, por exemplo, a ironia presente em "A sombra do homem que sorriu" com a terceira e a quarta estrofes do "Poema das sete faces". Procure encontrar as principais diferenças entre o poeta em formação daquele que viria a ser considerado, na maturidade, um dos mais importantes da nossa língua.

Comece a aula contando sobre a vida e obra de Drummond. Informe seu local de origem e a formação em Belo Horizonte. Conte também sobre a colaboração com a imprensa e a necessidade de trabalhar como funcionário público que o impediu (segundo suas próprias palavras) de se tornar um anarquista militante. Demonstre que Drummond e outros poetas da chamada geração de 1930 do Modernismo não necessitavam da afirmação estética, tão cara aos pioneiros de 1922. Isso permitiu a variedade de temas, que torna, especificamente no caso do poeta mineiro, a poesia mais reflexiva e participativa. Em outros autores, essa liberdade proporcionada pela geração de 1922 deixou o caminho aberto para a utilização de versos livres ou tradicionais, e também uma temática que em alguns momentos tendeu ao sentimentalismo e ao retorno às formas e estéticas tradicionais, como o soneto (em Jorge de Lima e Vinícius de Morais) e o Simbolismo (em especial, na poesia de Cecília Meireles).

Após esta apresentação, distribua à turma cópias da reportagem "A pré-história de Drummond". Destaque a importância da publicação de Os 25 poemas da triste alegria pela possibilidade de observar neles a gênese da obra lírica que marcaria a poesia brasileira no século 20. Ainda que considerados "menores", os poemas encontrados no livro são importantes para a formação do poeta. A seguir, faça uma leitura coletiva do "Poema das sete faces". Explique o modo como este poema, que abre o primeiro livro de Drummond, pode ser lido como uma apresentação que o autor faz de sua poesia. Em sete estrofes (as sete faces) são apresentados sete aspectos da personalidade do eu-lírico.

Explique que o poema apresenta, em tom de ironia amargurada, uma profissão de fé do poeta, que expõe sua posição em relação ao mundo. Logo na primeira estrofe, a face revelada é a de um gauche, palavra francesa que indica um indivíduo com dificuldades de adaptação, de caminho tortuoso e opções equivocadas, marginal inadaptado desde o início da vida. Isso pode ser comparado com a visão de mundo angustiada e irônica, mas sempre sensível, que marcou a obra poética de Drummond. Na segunda estrofe, há a insinuação do erotismo como uma busca desenfreada, um fim em si mesmo, que acaba se tornando um elemento de tristeza, que impede a tarde de se tornar azul, brilhante, por conta da vinculação aos desejos incontidos.

Na terceira "face" do poema, o eu-lírico remete à vida frenética e sem descanso das grandes cidades, com seus bondes cheios de pernas, idas e vindas sem sentido aparente - note que são "pernas" e não "rostos", o que remete à coletivização e à desumanização das pessoas em sua busca pela sobrevivência. O coração do poeta questiona o motivo de tanta correria desenfreada, mas seus olhos, analíticos e frios, resignam-se em apenas observar, como quem se resigna diante de um fato sobre o qual não se tem influência. Na quarta estrofe, os "olhos" do eu-lírico observam um homem que se apresenta com uma aura aparente de seriedade, simplicidade e força. No entanto, podemos interpretar o bigode como uma máscara social que torna o homem comum um ser com dificuldades de convivência, e o faz fechado em si mesmo. Mesmo quando o homem tem um rosto e não apenas uma perna, sua identidade também se dilui na busca pelas aparências, mais importante do que a essência de seu espírito.

Na quinta estrofe, observamos um retorno ao problema do modo tortuoso que o eu-lírico vive a vida. Este trecho indica uma dificuldade de adaptação e faz referência à passagem bíblica em que Cristo pergunta a Deus por que o havia abandonado. A inadaptação, aliada às contradições do gauche, deixam evidente a angústia desta condição, que leva o eu-lírico a se identificar com o sofrimento angustiado da expiação de Cristo. A sexta "face" pode ser interpretada como uma crítica ao modo parnasiano de fazer poético - a busca pela rima perfeita que não produz soluções à angústia do ser nem ao problema da tortuosidade e da inadaptação, mas apenas resolve o problema do poema, da arte distanciada da realidade. Finalmente, a sétima estrofe revela o motivo de tanta digressão, por parte do eu-lírico: a distorção se apresenta em tom de confidência, como se a visão angustiada e também irônica presente no poema fosse fruto de uma comoção causada pelo excesso de bebida e de luar.  Após a leitura e análise do "Poema de sete faces", indique à turma que leia "A mulher do elevador". Peça que encontrem elementos comparativos entre os dois poemas.

Questione as possíveis relações entre a saudade de uma mulher "sem cara", que sobe em um elevador, e passa como uma sombra fugaz, com as "pernas" que passam num bonde, ou homem que se esconde atrás de uma máscara social. Para a próxima aula, peça aos alunos que escrevam as conclusões a que chegarem a partir da leitura e das características da obra mais madura de Drummond.

Aula 2

Solicite a socialização das reflexões feitas a partir da aula passada. Anote no quadro todas as ideias.

Retome o "Poema de sete faces" e mostre que esta poesia foi tão marcante para a literatura que recebeureleituras poéticas e musicais. Na poesia, a mais célebre é "Com licença poética", de Adélia Prado, que retoma o motivo do poema de Drummond sob o ponto de vista de um eu-lírico feminino. Na música, Chico Buarque, com "Até o fim" e Jards Macalé e Torquato Neto, com "Let’s play that", fizeram suas homenagens ao poema.
Distribua aos alunos cópias do poema de Adélia Prado e das letras das músicas. Se possível, execute as canções após a leitura.

Peça à turma que estabeleça  comparações entre o "Poema de sete faces", "Com licença poética" e as canções. Anote no quadro os elos encontrados. Observe que a correspondência entre as músicas e os dois poemas é bastante evidente: todos falam da vida tortuosa, que "desafina" o coro dos contentes. No caso específico de Adélia Prado, há uma aproximação da condição da mulher no século 20 à dificuldade de adaptação ao mundo masculino, mas que no final, evidencia um caráter de força, apesar ou mesmo por causa desta necessidade de sobreviver à sina feminina de submissão. O poema questiona essa submissão ao afirmar que a mulher carrega uma bandeira e possui um caráter desdobrável, ou seja, adaptável às situações, ao invés do caráter "coxo" (deficiente) do homem.

Peça aos alunos que, a partir das comparações, escrevam um texto em prosa ou em verso, explicando o que é essa característica de ser gauche, da sina de pessoas inadaptadas. Indique que discorram sobre o que pode ser positivo e negativo em ser gauche no mundo.

Aula 3
Peça para que a turma leia o que produziu. A seguir, faça uma leitura do poema "O amor bate na aorta". Demonstre a intenção irônica do poeta em demonstrar o amor como uma entidade indomável, que tira do sério as moças e os homens, vira o mundo de cabeça pra baixo, mas que invariavelmente está presente e de certa maneira se torna um incômodo, até mesmo físico e inconveniente durante a vida. O poema demonstra o contrário da idealização tradicional do amor, comum na poesia romântica e parnasiana. Neste poema,mais do que um sentimento "puro", é um sentimento físico, que atinge a aorta, que leva à constipação, que ronca,  faz cócegas e se realiza na "geometria" e na "curva" de corpos. É possível identificar o amor como um garoto travesso, que pula muros, sobe em árvores, cai, se machuca, mas sempre deixa sua marca - uma ferida que nunca sara, e que às vezes, se cura no dia seguinte, e segue pronto para recomeçar suas estrepolias. Compare este poema com o inédito "Gravado numa parede" (que está na reportagem de Bravo!).

No poema feito na juventude, o poeta idealiza e se lamenta por um sentimento perdido, num tom melancólico que o aproxima do romantismo. Observe que a solução para as "lágrimas que enchem os olhos", no poema "O amor bate na aorta", é assistir a filme de Carlitos.

Sugira à turma que comentem os motivos que teriam levado Drummond a mudar de uma visão melancólica do amor a uma ideia irônica de um amor travesso e incompreensível, ainda que necessariamente presente.
Peça que comentem que tipo de amor caberia mais em nossos dias: o amor melancólico, irrealizável, como no poema "Gravado numa parede", ou o incontrolável, risonho e hiperativo, de "O amor bate na aorta". Solicite que discutam em duplas as diferenças entre o poeta em formação e o poeta maduro, e a seguir, exponham suas conclusões.

Aula 4
Inicie a aula exibindo o filme "O fazendo do ar". Indique as características da formação do poeta a partir de suas próprias palavras: a importância da família e do nascimento na cidade de Itabira; o modo de ser "mineiro"; o contraste com a vida burocrática de funcionário público no Rio de Janeiro.

Distribua e leia com os alunos o poema "José". Demonstre que é uma forma encontrada pelo poeta de expor a encruzilhada em que o homem comum encontra-se quando se dá conta das carências, da felicidade extinta. Compare o José do poema com o gauche do "Poema de sete faces". É possível encontrar algo da tortuosidade do eu-lírico inadaptado, torto, fora do eixo, gauche, com o eu-lírico de José? No "Poema de sete faces", a culpa pela inadaptação é de "um anjo torto", que "vive na sombra". Em "José", nota-se que a responsabilidade pela situação de indefinição é do próprio eu-lírico, que não encontra saída para a angústia de sua vida. Qual seria o motivo para tal indefinição?

Proponha à classe uma atividade avaliativa. Peça que leiam o poema "José" e também "Morte do Leiteiro". A seguir, proponha que os alunos escrevam um texto em que se possa relacionar a angústia de "José" ao medo que leva ao assassinato de um inocente, no poema sobre o leiteiro. Reserve uma parte da aula seguinte para a leitura coletiva das produções dos alunos.

Avaliação
Observe se os textos produzidos demonstram compreensão do contexto da obra de Drummond. Utilize as discussões como base para saber se a turma entendeu os elementos irônicos, sociais e analíticos e a influência desta obra poética na literatura do século 20. Verifique também se os alunos conseguiram encontrar elementos relacionados à obra do poeta quando jovem e a sua obra na maturidade.

Quer saber mais?
Alguma poesia. Carlos Drummond de Andrade. Companhia das Letras, 2012.
Antologia poética. Carlos Drummond de Andrade. Companhia das Letras, 2012.
Bagagem. Adélia Prado. Editora Record, 2009
Brejo das Almas. Carlos Drummond de Andrade. Editora Record, 2001.
Fotobiografia. Mário de Andrade, Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade. Livroarte Editora, 2001.
História concisa da literatura brasileira. Alfredo Bosi. Editora Cultrix, 2008.
José. Carlos Drummond de Andrade. Companhia das Letras, 2012.
A Rosa do povo. Carlos Drummond de Andrade. Companhia das Letras, 2012.
Sentimento do Mundo. Carlos Drummond de Andrade. Companhia das Letras, 2012.
André Rosa
* Professor de Literatura e Mestre em Educação pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG).

FONTE: NOVA ESCOLA
 http://revistaescola.abril.com.br/ensino-medio/fases-poesia-drummond-688542.shtml